Cotidiano

Quão segura para turistas LGBTI é a Alemanha?

País perdeu parte de sua atratividade como destinação para lésbicas, gays, bi e trans, afirma blog de viagens. Mas esse segmento turístico continua forte, sobretudo quando as cidades celebram o Dia do Orgulho Gay. Participantes seguram uma bandeira do arco-íris durante o Christopher Street Day, parada gay anual em Frankfurt, na Alemanha, no dia 20 de julho.
Andreas Arnold/dpa/AFP
No segundo trimestre de 2019 soou o alarme na redação do blog de viagens gay Spartacus, em Berlim: a Alemanha caíra fragorosamente no ranking de seu mais recente Gay Travel Index (GTI), do 3º para o 23º lugar. Responsável foi principalmente a violência crescente contra lésbicas, gays, bi, trans e intersexuais (LGBTI), relata Leander Milbrecht, da redação do blog.
“A queda da Alemanha no GTI 2019 é culpa dos crimes e ataques contra pessoas LGBTI”, confirma o autor, citando que apenas em 2018 a polícia de Berlim registrou 225 delitos contra pessoas queer (não conformes com a heteronormatividade), 54 mais do que no ano anterior. Segundo o projeto gay antiviolência berlinense Maneo os casos chegariam até a 382, 58 a mais do que em 2017.
Milbrecht enfatiza que, segundo dados oficiais, a tendência crescente se faz sentir em todo o país. Além disso, especialistas contam com uma “cifra oculta” elevada, pois grande parte das vítimas sequer apresenta queixa.
O Spartacus, especializado em guias de viagem para homossexuais masculinos, emprega uma série de critérios para ordenar 197 países em seu Gay Travel Index. Há perigo de perseguição, pena de morte ou agressões violentas? Há discriminações sancionadas pelo Estado, como restrições de viagem para soropositivos ou a proibição de Paradas do Orgulho Gay? Qual é a situação dos direitos civis?
Nesse quesito, a Alemanha ganhou pontos em 2018, ao introduzir o “casamento para todos”. Até o momento, a reputação de internacional do país é de ser livre e tolerante, com Berlim como porto seguro para LGBTIs perseguidos em seus países de origem.
A reputação de internacional do país é de ser livre e tolerante, com Berlim como porto seguro
REUTERS/Fabrizio Bensch
Será que tudo isso mudou dramaticamente? Será o caso de divulgar advertências aos turistas, justamente quando numerosas cidades alemãs festejam o Dia do Orgulho Gay – ou Christopher Street Day (CSD), como é conhecido no país –, com a participação de tantos turistas LGBTI? Jan Noll, redator-chefe da revista queer berlinense Siegessäule, aconselha calma.
“Eu não diria que os ataques homófobos tomaram uma dimensão tal que se deva desaconselhar as pessoas de viajarem para a Alemanha.” Como outros especialistas, ele supõe que o incremento dos números também se deva à maior disposição de prestar queixa, por parte das vítimas de agressões.
David Staeglich-Büge, da diretoria do CSD de Berlim, avalia a questão de modo semelhante. É claro que ele adoraria ver a Alemanha na primeira colocação, na categoria segurança, sobretudo considerando que neste fim de semana (26-27/07) o orgulho gay é celebrado na capital alemã em grande estilo.
Segundo ele, nada mudou: “O sentimento de segurança dentro da community berlinense continua muito grande.” Quanto a certa instabilidade que se infiltra atualmente nos meios LGBTI, ele a atribui antes à política: “A ameaça da direita é percebida mais fortemente do que a da criminalidade de ódio.” Mas para a Parada do Orgulho Gay de Berlim, a maior e mais internacional do país, o fato não tem qualquer impacto, asseguram os organizadores.
Pelo contrário: no 50º aniversário da revolta dos gays contra a arbitrariedade policial, no Stonewall de Nova York, a metrópole alemã aguarda mais visitantes do que nunca. Por outro lado, o fato de a Alemanha não ter respondido com um plano de ação ao aumento das agressões registradas contra queers também teve efeito negativo sobre sua colocação no GTI, avalia o Spartacus.
“O presidente francês, Emmanuel Macron, reagiu a um incremento semelhante”, lembra Leander Milbrecht. Na Alemanha, em contrapartida, apenas estados como Berlim expediram planos de ação, sem que houvesse qualquer iniciativa equivalente no nível federal.
Alemanha caiu do 3º para o 23º lugar no ranking Gay Travel Index (GTI)
Henning Kaiser / dpa / AFP
Segundo o blog de viagens gay, o terceiro grande ponto negativo para o país é a falta de uma legislação moderna para trans e intersexuais. A comunidade LGBTI critica severamente a Lei da Terceira Opção, que entrou em vigor em dezembro de 2018, permitindo, além de “masculino” e “feminino”, a definição de sexo “diverso”. Segundo Jan Noll, da Siegessäule, desse modo se dificulta tremendamente a mudança do estado civil, sobretudo para os transexuais.
Ainda assim, ele critica a decisão do blog de viagens de deixar essa insegurança jurídica influenciar seu ranking turístico. “Os critérios que o Spartacus emprega são políticos, não se manifestam na rua, não são critérios que devam influenciar os planos de viagem.”
E, de fato, muitos não consideram esse detalhe e acorrem à Alemanha. Contudo no futuro muito pode estar em jogo: a Central Alemã de Turismo considera os LGBTIs um segmento de mercado importante, estimando que sejam responsáveis por 3% do total anual de 1,2 milhão de viagens à Alemanha. Em Berlim, o segmento chega a responder por um sexto de todas as reservas de hotéis.
Isso é incentivo suficiente para que a Alemanha se esforce por ocupar um bom ranking no Gay Travel Index. Se possível, o primeiro lugar, que no momento é partilhado por três países: Canadá, Suécia e Portugal.
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redação

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